sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Artaud

Mesmo se afastando de forma bastante intensa das concepções Stanislavskianas, An­tonin Artaud (1896-1948) também tinha como base de seu pensamento o desejo de atingir os sentidos da platéia tendo a voz como um meio eficaz para que o ator pudesse chegar mais facilmente à alma do espectador. Para isso, ele acreditava que era preciso o abandono da pa­lavra como código fixo. Em seus escritos, Ar­taud, se referia ao uso da palavra no teatro ora a defendendo, ora a rechaçando, no entanto, o fundamental, em seu ponto de vista, seria o uso da fala e da voz pra fazer com que o es­pectador se sentisse tocado (VIRMAUX, 1978).

Artaud reconheceu o texto como fonte de estímulos para o trabalho do ator e a partir dis­so passou a estudar a necessidade de se trabal­har com as metáforas como criação de imagens que qualificariam a palavra. Desse modo ele não condenava o uso da palavra, mas acredi­tava que a encenação não devesse ser sub­missa ao que o texto dizia literalmente, nem à mensagem que o autor queria transmitir. Se­gundo Artaud, a escravização ao autor teria uma carga fúnebre, pois as palavras deixam de pertencer a quem as escreveu quando estão sendo encenadas, as palavras para o ator pos­suem infinitas possibilidades em seu espírito e não em suas letras (Idem). Para Artaud, o ator, com base no que o texto sugeria, devia, sobre­tudo, criar, mesmo que para isso fosse preciso destruir o texto em termos de sintaxe.

Ao falar a respeito da linguagem e de como ela deve ser empregada no teatro, Ar­taud afirma que:

Trata-se de nada menos do que mu­dar o ponto de partida da criação artística e de alterar as leis habituais do teatro. Trata-se de substituir a lin­guagem articulada por uma lingua­gem diferente, cujas possibilidades expressivas equivalerão à linguagem das palavras mas cuja origem será buscada num ponto mais profundo e mais recuado do pensamento (AR­TAUD, 1984, p. 140-141).


Artaud buscava através da exploração das sonoridades vocais atingir um nível mais elevado com relação aos significantes da ação cênica, nível este que deveria ir além do signifi­cado6. No uso de um texto verbal o ator deve­ria revelar tudo que houvesse de mais oculto e desconhecido através do som das palavras, po­dendo até distorcer seus significados em busca de maiores possibilidades de seus significantes (BONFITTO, 2002). Neste sentido, Artaud não apregoava exatamente a rejeição da palavra, mas reivindicava que os encenadores procu­rassem ter maior liberdade com o texto a par­tir da exploração do significante e da expres­sividade para que, desse modo, pudessem ter maiores possibilidades para o trabalho com a palavra. Para Artaud, as palavras deveriam ser “utilizadas num sentido encantatório, verda­deiramente mágico – em função de sua forma, de suas emanações sensíveis, e não mais de seu significado” (ARTAUD, 1964 apud ROUBINE, 1982, p. 60). Nesse sentido, percebe-se que o enfoque de Artaud privilegia, sobretudo, a ex­pressividade, valoriza a forma, a sonoridade das palavras e, diferentemente de Stanislavski, não vincula expressividade ao conteúdo, mas à sensibilização sonora do ouvinte.



Referencial Bibliográfico

Do Ator ao Espectador: A voz que toca
Profª. Dalva Maria Alves Godoy
Daniela Taiz de Souza

ARTAUD, Antonin. O teatro e seu duplo. São Paulo: M. Limonad, 1984.
BERRY, Cicely. La voz y el actor. Adaptação de Vicente Fontes. Barcelona: Alba Editorial, 2006.
BONFITTO, Matteo. O Ator Compositor. São Paulo: Perspectiva, 2002.
GAYOTTO, Lucia Helena. Voz-Partitura da ação. São Paulo: Summus, 1997.
GROTOWSKI, Jerzy. Em busca de um teatro po­bre. Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 1992.
KNÉBEL, Maria Ósipovna. La Palabra en la Cre­ación Actoral. Madrid: Editorial Fundamentos, 1998.
MARTINS, Janaína Träsel. A integração corpo-voz na arte do ator: a função da voz na cena, a pre­paração vocal orgânico, o processo de criação vocal. Dissertação de Mestrado, não publicada, Curso de Pós-Graduação em Teatro, Universidade do Estado de Santa Catarina-UDESC/Ceart, 2004.
ROUBINE, Jean-Jacques. A Linguagem da Ence­nação Teatral 1880-1980. Rio de Janeiro: Zahar, 1982.
SAUSSURE, Ferdinand de. Curso de Linguística Geral. 24ª edição. São Paulo: Cultrix, 2002.
STANISLAVSKI, Constantin. A Construção da Personagem. 2ª edição. Rio de Janeiro: Civiliza­ção Brasileira, 1976.
______. A Preparação do Ator. 2ª edição. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1968.
______. Manual do Ator. São Paulo: Martins Fontes, 1989. VIRMAUX, Alain. Artaud e o Te­atro. São Paulo: Martins Fontes, 1989.
VIRMAUX, Alain. Artaud e o Teatro. São Paulo: Perspectiva, 1978
 

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